Cris Pizzolato e o blues da Fronteira Oeste
| Arte: Will Rohden e Cris Pizzolato | |
Nascido em 1989, em Uruguaiana/ RS (cidade colada a Paso de Los Libres, na Argentina), Cris Pizzolato bebe da água doble chapa, termo utilizado nas fronteiras do sul do país para distinguir o indivíduo que tem dupla nacionalidade. No caso específico, trata-se de um cruzamento que forja sua credencial artística, pois sabemos: nas cidades de fronteira a cultura muitas vezes fica em segundo plano — e, fazer som com a influência do blues —, é muito mais penoso para um músico distante dos grandes centros. Ao atravessar a ponte, muitas vezes uma nova brecha se abre. Mesmo assim, em ambos os lados, não há um circuito de bares, muitas vezes também não existe um público interessado, são poucos os iguais para trocar figurinhas, possivelmente apenas alguns gatos pingados estejam dispostos a compartilhar do mesmo copo. Consequentemente, muitas vezes a desilusão bate forte, e no meio do caminho, desistir parece ser a coisa certa. Não para o personagem deste post.
De todo modo, aos 34 anos, um de seus emblemas artísticos é o orgulho de ser um dos músicos locais que passou pela Academia do Carmão. Aos desavisados, Carmo Goulart, guitarrista e compositor da Black Sanga Grande Blues, morreu aos 75, em dezembro de 2023. Sua passagem pelo planeta não foi em vão, pois através dessa escola autodidata, catequizadora de muitos e baseada em toneladas de ativismo, Carmão lançou algumas sementes no solo árido da Fronteira Oeste. Assim, mesmo com todas as intempéries e dificuldades, produziu frutos, e entre eles está Cris Pizzolato.
Leia review do show da Black Sanga Grande Blues no Ferrovia Bar (Uruguaiana/ RS)
Foto: Rodrigo Fernandes |
Pizzolato entre Áureo e Carmo Goulart (B.S. Grande Blues (dez, 2019) |
Em 2023 lançou dois singles — “Efeito”, uma releitura de Emerson Dent, e a peça autoral, “Pé na Porta”. Ao raiar do novo ano, no último dia 8 de março, Cris Pizzolato colocou no mundo “Disperso”, seu pontapé inicial em 2024. A música traz algumas de suas digitais: o estilo narrativo e discursivo — como se as músicas fossem crônicas urbanas — muitas vezes ausente de rimas, mas sempre trazendo camadas e climáticas no alicerce instrumental. Mixado por Cristiano Scherer e mastrizado por Sanjai Siri, tudo que você ouve em “Disperso” foi tocado por Pizzolato em seu home studio, prova de uma capacidade resolutiva em tocar em frente as coisas, pois, se não há outros músicos para acompanhá-lo, como artista ele se materializa em one man band nas sessões de gravação.
Para um futuro próximo, Cris Pizzolato já está em período gestacional de um novo álbum, o sucessor de “Instintivo”. Na garagem, caminhões de demos e cacos de som começam a ganhar vida e virar canções. Aguardemos cenas dos próximos capítulos.
Ouça "Disperso".
Comentários
Postar um comentário