Entrevista inédita: "Hoje tudo é descartável, não há mais magia no rock", diz Glenn Hughes

Divulgação
#
MÚSICO INGLÊS VEM AO BRASIL COM O SHOW 'GLENN HUGHES PERFORM CLASSlC DEEP PURPLE LIVE' 

Por Márcio Grings

Glenn Hughes, músico inglês que incrustou seu nome em bandas importantes da história do rock, fará nova turnê pelo Brasil em 2018. Trata-se do espetáculo "Glenn Hughes performs Classic Deep Purple Live", show em que o o artista britânico revisita clássicos do período em que atuou no Deep Purple. Inclusive, está entre sua carta de intenções, lançar um documentário sobre a futura turnê (saiba mais).

Vídeo: Glenn convoca o público a conferir seu novo show.



Hughes esteve no Purple entre 1973 e 1976, participando dos álbuns "Burn" (1974), "Stormbringer" (1974) e "Come Taste the Band" (1975). E agora, mais de 40 anos depois do último show que fez com o grupo  (em 15 de março de 1976), o veterano de 66 anos volta a tocar um repertório baseado em suas composições e participações na banda que o tornou uma lenda. A apresentação em Porto Alegre ocorrerá em 28 de abril, sábado, às 20h, no Opinião (Rua José do Patrocínio, 834). Ingressos AQUI. Antes da capital gaúcha ele ainda se apresenta em Brasília (17/4), Belo Horizonte (19/4), São Paulo (21/4), Limeira (22/4), Curitiba (24/4), Manaus (26/4). O último show no Brasil será no Rio (29/4).

Conheça os músicos que acompanham GH no tour  Ouça o provável setlist 

Em entrevista exclusiva ao Memorabilia, Glenn fala sobre suas lembranças no Purple: "Aqueles dias foram fantásticos! Aprendi muito. Tudo o que eu queria era APRENDER: tocar, escrever canções, cantar... Nada mais importava"; ele também reflete sobre o clima barra pesada que tomou conta do Purple durante as gravações de "Come Taste the Band", álbum derradeiro da banda nos anos 1970: "Não tínhamos mais condições de conviver uns com os outros"; fala ainda da relação com Ritchie Blackmore e Tommy Bolin; revela a fonte de sua influência na música negra; alerta sobre o perigo do abuso nas drogas; e nos conta sua expectativa antes dos shows no Brasil.

***
Memorabilia - Acredito que você foi um dos primeiros a misturar a energia da música negra com o hard rock, digo isso no que tange ao desempenho vocal mesmo. De onde surgiu a matriz para essa inspiração?

GH - Essa forma de cantar veio das minhas primeiras influências da música soul - Tamla Motown e Stevie Wonder, principalmente... Então, a veia rock eu busquei no Cream, Beatles, Jimi Hendrix, para depois novamente beber na música negra, falo de roupagens funk que encontrei em artistas como Sly Stone. Eu sempre combinei rock com soul music. 

Divulgação
Memorabilia: E como seus colegas de Purple receberam essa influência nas composições? 

A banda era receptiva, pois era formada por grandes músicos. No entanto, todos sabemos que Ritchie Blackmore não apreciou tanto assim o meu estilo. Bem, minha forma de cantar já estava presente no Trapeze (banda de onde Hughes saiu para adentrar as fileiras do Purple), então eles tinham plena consciência de que eu não era um cantor que utilizava apenas o rock como matriz.

Memorabilia Como guitarristas/compositores, quais as diferenças que você identifica entre a abordagem de Ritchie Blackmore e de Tommy Bolin? 

GH - Ambos tinham personalidades e abordagens muito diferentes. Ritchie era o clássico herói da guitarra, um cara estranho fora do palco e todos sabemos disso. No entanto, Ritchie sempre foi muito gentil comigo e como colegas de banda tivemos um excelente relacionamento. Já Tommy era um trovador moderno, muitos estilos de tocar guitarra num único instrumentista, e além de tudo - um ser humano amável e doce. 

Memorabilia: Você é Tommy eram muito íntimos, não é?

GH - Ele era como um irmão pra mim. 

Memorabilia - E como foi o convívio com Blackmore? 

GH - Foi bacana trabalhar com Ritchie. Comigo, fora do palco ele sempre foi muito amável, sem rusgas ou  coisas do gênero.

Memorabilia: Reza a lenda de que ele sempre foi um músico complicado no que compete a seu relacionamento com colegas de banda. Ah, é verdade que ele determinava um espaço específico para você transitar no palco? 

GH - A marcação existia sim, era uma linha imaginária no palco criada por ele, que me pediu para não ultrapassar essa tal marca. Eu passei uma vez, e ele enlouqueceu comigo! Bem, todos assistiram "California Jam", dá pra perceber as explosões dele, isso sempre foi um risco iminente enquanto tocamos juntos! Na verdade eu queria contagiá-lo com essa vibração, e os fãs adoravam. Rock and roll é feito por personagens e atuações, e você sabe, era assim que a MARK 3 ( como ficou conhecida entre os fãs essa terceira encarnação do DP) atuava.

Memorabilia - Como se deu o processo de escolha dos temas e qual foi o critério para montar a banda que o acompanha no tour?

GH - Eu tentei criar um repertório visual, consistente e emocionante, um verdadeiro espetáculo para fãs de rock... E eu acredito que temos esses ingredientes! Eu também precisava de músicos que pudessem interpretar o sentimento e o espírito dos rock dos anos 1970 no Deep Purple. Será nossa primeira vez com o novo baterista [Fernando Escobedo, músico chileno de apenas 25 anos). Eu acho que os fãs vão adorar..

Glenn Hughes (segundo a esquerda) com o Deep Purple nos anos 1970. Foto: divulgação
#
Memorabilia - Você ainda conversa com algum músico no grupo? 

GH - Não tenho contato com nenhum deles, exceto David Coverdale. 

Memorabilia: E como você vê o Deep Purple hoje?   

Não ouvi um único registro do Deep Purple em 30 anos [ele se refere possivelmente ao que foi lançado após 'Perfect Strangers], então, pra ser sincero, não posso me pronunciar a respeito.

Memorabilia - Você mesmo teve sérios problemas com drogas, que recado você daria para o Glenn Hughes de 22 anos, prestes a ser integrado ao Deep Purple?

GH - Vejo um jovem que encontra nas drogas e no álcool algo excitante e disponível.  O lado obscuro é que esse comportamento leva ao vício e consequentemente até mesmo a morte. Não são muitos que sobreviveram para contar esse experiência, mas eu sobrevivi! Hoje procuro alertar a todos para manter distância dessas tentações. Meu 'eu' mais novo certamente não teria ouvido ao meu 'eu' mais experiente. Ele teria que descobrir da maneira mais difícil...

Memorabilia - Você também anunciou que irá gravar os shows do atual tour para posterior lançamento de um documentário. Isso tudo também não pode virar um álbum ao vivo?

GH - Eu espero que sim! Será algo especial captar esse material ao vivo.

Memorabilia - Em perspectiva, como você vê o rock de hoje e para onde aponta o futuro do gênero?

GH - Com todo o devido respeito, não vejo nada excepcional, nada ambicioso e transgressor como o que foi feito nos dias de glória do Led Zeppelin, Black Sabbath e Deep Purple. Estou sempre na expectativa de me deparar com um novo grupo que acabe por me surpreender, mas até agora não há nada comparável com a música criada nos anos 1960/70. Hoje, tudo é descartável, não há mais magia no rock. 

Memoabilia - E o público brasileiro sempre o recebeu bem por aqui, qual sua expectativa para essas novas apresentações no Brasil e América do Sul?

GH - Estou construindo um material sólido o bastante para sair em tour com o Classic DP Live. Chegou o momento de dar aos fãs o que sempre quiseram ver de Glenn Hughes no palco: um show de rock com material clássico. Estou ansioso para cair na estrada. Será emocionante e intenso. Não percam!

Colaboraram: Cristiano Radtke/Lúcio Brancato

***

Leia também: - Entrevista com Billy Gibbons (ZZ TOP) - Entrevista com Mark Farner (Grand Funk Railroad) 

Comentários