Há 50 anos Neil Young lançava seu primeiro álbum solo

Neil Young - 1969
Por Márcio Grings

"Quero fazer discos que as pessoas possam ouvir durante muitos anos". A declaração de Neil Young relatada numa entrevista ainda no início dos anos 1970, de certo modo pode parecer premonitória. E é... Nesta terça-feira (22), o álbum homônimo "Neil Young", lançado em 22 de Janeiro de 1969, completa 50 anos de seu lançamento. O LP marca a estreia do músico canadense fora do Buffalo Springfield, grupo que se desintegrara poucos meses antes, sendo também o marco inicial de uma carreira solo de um artista que hoje é reconhecido mundialmente. Ele tinha apenas 24 anos quando o vinil chegou às lojas. 

Neil e sua primeira esposa, Susan Acevedo. Crédito: www.whosdatedwho.com 
"Neil Young" foi produzido por Ry Cooder e Jack Nitzsche, com coprodução do próprio artista. Cooder (guitarra) e Nitzsche (piano) também contribuem como músicos. A banda inclui Jim Messina (baixo) e George Grantham (bateria), que logo depois formariam o Poco com Richie Furray, que assim com Young, era um ex-Buffalo Springfield. Dois integrantes do Wrecking Crew também colaboraram nas gravações - Carol Kaye (baixo) e Earl Palmer (bateria). A ilustração da capa é do desenhista Roland Diehl, um hippie residente em Topanga Canyon. Inclusive, grande parte das canções nasceram em Topanga, localidade situada na West Hollywood, na casa de Neil. Na época, ele havia casado com Susan Acevedo, uma ex-garçonete de um de seus restaurantes preferidos na região, o Canyon Kitchen. A mansão - de quatro andares - foi toda construída em pau-brasil, situada estrategicamente no cume de um dos montes de Topanga, completamente isolada.       

Vista da casa de Neil Young em Topanga Canyon. Crédito: athomeinhollywood.com
Passado cinco décadas, apesar de ter dividido crítica e público naquele finalzinho de anos 1960, "Neil Young" é um trabalho que certamente merece revisionismo. Numa audição mais atenta é muito fácil perceber que as canções são incríveis, fora da curva que seus  partners estavam percorrendo. Além do mais, o LP já começa no contrassenso da forma de atuação dos artistas daquele período, muitos deles obstinados em figurar nas paradas de sucesso. A faixa instrumental "The Emperor of Wyoming" abre o Lado A tingindo os primeiros segundos da audição com as cores da country music. O recado é de que muitas vezes a ambiência passa a frente da vocalização. E falando propriamente sobre seu vocal, Neil ainda não vendia confiança na forma como cantava suas composições, por isso, invariavelmente o vocal está propositalmente mixado mais baixo, assim como sua voz muitas vezes surge tímida e sussurrada. Cinco décadas depois, essa intenção também empresta um charme especial ao disco.

Para muitos, há falhas na produção, ausência de massa sonora, mas nada que conseguisse ocultar o surgimento de um compositor maduro, um intérprete com caraterísticas muito peculiares. Canções de amor como "If I Could Have Her Tonight" e "I've Been Waiting for You" são melodicamente surpreendentes, emolduradas por letras marcantes, com forte carga poética e repletas de emoção. "The Loner" é momento mais pesado - e também um dos mais interessantes, além de se tornar presença frequente nos setlists do músico a partir de então, principalmente em apresentações ancoradas pelo Crazy Horse. Para muitos, "The Loner" teria sido inspirada em Stephen Stills, seu parceiro de Buffalo ( e futuro companheiro de Crosby, Stills, Nash & Young), mas na verdade fica claro que a canção fala mesmo é do protagonista, pois se encaixa perfeitamente na figura misantropa que Neil Young se tornara na época.

Neil em Topanga. Crédito: www.stereogum.com 
Ouvindo atentamente, num disco repleto de bons momentos, a obra mais reluzente ainda é "The Old Laughing Lady", tema com letra misteriosa e obscura, um transito com a insanidade e a morte, repleto de imagens vagas, mas altamente sugestivas, alegóricas. Os vocais femininos de Merry Clayton, Brenda e Patricia Holloway, Gloria Richetta Jones, Sherlie Mattews e Gracie Nitzsche emprestam um tom espectral ao tema. O quinteto vocal, batizado sugestivamente por Greil Marcus (Rolling Stone Magazine) como "As noivas de Drácula", não passa de uma feliz alcunha associada a dramaticidade e tensão materializada nessa comunhão de vozes. Trata-se de um dos instantâneos mais intensos do álbum. Em versão acústica, "The Old Laughing Lady" ainda se transformou num interessante capítulo dos sets acústicos em apresentações ao vivo. Impossível não mencionar a versão do "Neil Young - Unplugged MTV", um dos grandes discos lançados em 1993.

E 1969 ainda teria um segundo álbum de Neil Young, uma experiência sonora que não deixaria pedra sobre pedra, soprando para longe qualquer dúvida a repeito de seu talento. Mas essa já é uma outra história...

Neil Young - Neil Young - 1969/tracklist

Lado A

1. "The Emperor of Wyoming"
2. "The Loner"
3. "If I Could Have Her Tonight"
4. "I've Been Waiting for You"
5.     "The Old Laughing Lady"

Lado B

1. "String Quartet from Whiskey Boot Hill"
2. "Here We Are in the Years"
3. "What Did You Do to My Life?"
4. "I've Loved Her So Long"
5. "The Last Trip to Tulsa"

Ouça na íntegra.

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