A balada do sapato azul
Todas as noites, quando
coloco a cabeça no travesseiro, mesmo sabendo que você está a milhares de quilômetros
de distância, de toda a maneira, acredite: sim, eu consigo ouvir o som dos teus sapatos
de salto alto no assoalho da minha casa.
“toc-toc.. toc-toc... toc-toc”.
É quando surge tua imagem cruzando
a sala num calçado azul brilhante. Panturrilhas salientes, firmes, pernas brancas
envolvidas numa meia-calça cor da pele. Vestido-azul-escama-de-sereia, cabelo preso,
rosto levemente maquiado. Cílios pintados, olhos castanhos límpidos. Sorriso aberto como um sol nascente.
Outras vezes me vejo em teu apê, deitado no sofá, te esperando com a mesa posta. Naquela sala o barulho dos sapatos azuis retumba como uma canção bonita vinda dos teus pezinhos. Como único expectador, lembro de assistir a diversos desfiles teus. Um privilégio só meu.
Por onde andarão aqueles
sapatos? Por que ruas desenham tua presença? Por que salões de baile &
com quem eles dialogam danças & cruzamentos de pernas? Será que alguém
pisou nos teus dedos do pé? Será que a silhueta & os contornos do teu corpo
estão sendo devidamente visualizados por “esses estranhos sujeitos” que povoam
teus dias & noites?
Tenho certeza, ninguém... NINGUÉM além
de mim tem a capacidade de admira-la tão bem. Sou dotado de uma espécie de tino
que identifica o belo antes que o resto humanidade o perceba. Diz pra mim que
ninguém ainda percebeu toda a beleza que há em ti? A complexidade dela, as
nuanças que respiram dentro dessa curva que leva a tua alma. Teus anseios, desejos mais íntimos e aspirações.
Diz...
Ah, eu ainda ouço o som dos
teus sapatos de salto vazando dos elevadores, descendo & subindo escadas. Os
dedos confortavelmente exprimidos dentro daquele espaço que te sustenta. Há
equilíbrio, força & garbo em cada gesto que desencadeia teus movimentos. Elegância não se compra na esquina. Há poesia nas tuas viradas de pescoço, a forma como olha e abre a boca & o som que a tua voz se desdobra até os meus ouvidos.
E saiba, meu amor, todas as noites, quando
coloco a cabeça no travesseiro, imagino tua imagem chispando no asfalto & nos
paralelepípedos das capitais e cidadezinhas do mundo. Entrando & saindo de táxis & automóveis. Vasculhando bares, restaurantes e boutiques. Embarcando em
aeroportos & outras viagens.
Mas... Quando paro & penso em tudo que vivemos - aquele som dos teus sapatos azuis brilhantes – é que reluz mais intensamente nas minhas lembranças. Você, minha música favorita. Você, minha prata & meu ouro. Você, o sino de Belém que ressoa além do tempo.
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