Liquidâmbar




Crônica #4 publicada no Diário de Santa Maria 10/08/2012 | N° 3217

O liquidâmbar é uma árvore oriunda da América do Norte. De porte alto e piramidal, é uma espécie que produz folhas em forma cônica, adquirindo o formato de estrela com cinco a sete lóbulos. Em seu esplendor, que acontece no outono, a árvore ganha belas cores em tons de púrpura, amarelo ou vermelho e produz as pequenas frutas (não comestíveis), que resistem até princípios do Inverno. E é justamente a estação fria que o deixa completamente desnudo, sem uma folha sequer, como um esqueleto abandonado, ou sucata enferrujando no ferro-velho. Já na primavera suas folhas exalam uma fragrância sutil e agradável. Plantei o meu Liquidâmbar no quintal de casa há 11 anos. Uma muda com poucos centímetros que me custou, na época, se não me falha a memória R$35,00. Ao longo do tempo, nunca descuidei do crescimento da arvorezinha. Aguei a planta com carinho e lhe dei muita atenção. Dediquei-me. Houve incidentes durante o percurso. Certa vez atropelei aquela criança em forma de planta com meu fusca. Com apenas um galho quebrado, o liquidâmbar sobreviveu, crescendo saudável, repleto de galhos e viço. Quando chegar o próximo verão, novamente poderei sentar a sua sombra. Possivelmente puxe um ronco sobre a proteção das folhas e galhos, em uma daquelas desejadas e esperadas “siestas” de domingo.

Quando penso na “minha” árvore, quase sempre surgem na memória diversas cenas de “Hair” (1979), filme de Milos Forman gravado no Central Park, em Nova York, famosa área verde da Big Apple onde os liquidâmbares bordam de vermelho o outono na mais cosmopolita das metrópoles mundiais.  Não sei por quê, mas também lembro de Walt Whitman e suas "Folhas de Relva".      

Às vezes tenho a impressão que de tudo aquilo que adquiri em vida - nem mesmo minha casa - na verdade me pertence: apenas aquele liquidâmbar. Falando sobre posse (e possessões), eu, por exemplo, apenas pego as coisas emprestadas. Inclusive o corpo que tenho. Sei que sou muito mais antigo do que a certidão de nascimento na qual fui registrado. Essa antiguidade imperceptível aos olhos de muitos também me carimba com a resiliência necessária para suportar as agruras da existência. Todos nós estamos de passagem por esse circo de loucos que é o Planeta Terra, e, ao final, não somos donos de nada. Talvez nem mesmo de nossa alma. Sério! No caso, meu atual espólio é formado por apenas um item:  o liquidâmbar. 

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