O banho sempre fica pra depois



Crônica #6 publicada no Diário de Santa Maria 24/08/2012 | N° 3229


Elmo chegou cansado em casa. Alimentou os gatos e deixou o banho pra depois. No frigir dos ovos, o banho sempre fica para depois. Antes, precisava cozinhar algo pra enganar o estômago. Procurou no congelador uma carne ou algo parecido. Acabou separando uma espécie de pequeno iceberg que imaginou ser frango congelado. “Arroz com galinha”, pensou. Eis o cardápio da noite definido em uma fração de segundos. Jogou aquela coisa dentro de uma panela com água e colocou no fogão. Demorou a encontrar o isqueiro. Isqueiros desaparecem da cozinha quando precisamos dele. Sempre pensa em bips eletrônicos e localizadores numa hora dessas. Achou a porcaria! Acendeu a boca com a chama mais alta e foi para a internet dar uma sacada nos acontecimentos.

Nada de novo no front. Várias mortes no trânsito, greves e mais greves, julgamento e corrupções de políticos em todos os sites e insonsas manchetes de futebol. Passados alguns minutos, ele vai dar um bico no fogão e descobre que aquilo que julgava ser frango não passava de um porco. Uma carne suína perdida há meses dentro do congelador. Pestanejou no ato.

Estava decepcionado com seu engano. Mesmo assim, deixou cozinhar mais alguns minutos. Alteração de plano de voo. Tirou o porco da panela. Puxou a tábua de carne e picou a janta em pedacinhos. Um misto de raiva e atitude. Deu uma cafungada de perto e chegou à conclusão que o resultado final não transformaria a comida em algo apetitoso. O estômago roncou em protesto, avisando-o: “Elmo, você precisa salvar a nossa noite!”. Isso exigia medidas imediatas!

Colocou arroz para cozinhar, cortou uma cebola e meio pimentão. Pegou uma panela de ferro e lançou a carne de porco picada lá dentro. Com o azeite salpicando suas mãos e o chão da cozinha, aos poucos foi adicionando sal e os outros ingredientes. Terminou o set pulverizando pimenta e pingando gotas de limão em cima de tudo. Definitivamente, o resultado final daquilo tudo não cheirava nada bem. Desligou o arroz e resolveu provar a refeição. Ficou horrível. Culpa da ação do tempo sobre uma carne de segunda preterida há alguns meses ou da Era Glacial “fake” promovida por uma geladeira de última geração.

Ficou pensando nas mensagens implícitas desse acontecimento culinário. “Que saudades da comida da mamãe”, Elmo pensou em voz alta! Depois, concluiu que existem outras ‘coisas’ congeladas por um tempo em sua vida e que, em algum recanto obscuro, permanecem adormecidas. Depois de um tempo, não adianta colocá-las no forno micro-ondas. Até por que ele não tem micro-ondas. E no final das contas, temos gato por lebre ou porco por frango! Algumas coisas deveriam ficar para todo o sempre no fundo do congelador. Elmo foi dormir. Congelou o banho pra manhã seguinte

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