A volta do Bobby

Na direita, letreiro indicando uma das lojas do Bobby. Anos 70, calçadão de Santa Maria

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Se você morou em Santa Maria, ou aqui na região centro do estado do Rio Grande do Sul, e era consumidor de discos e aparelhos de som nas décadas de 70, 80 e 90, então você deve se lembrar do Bobbysom. Localizada na rua Dr. Bozano (depois Calçadão), em Santa Maria, o Bobby foi uma das lojas mais tradicionais do gênero no interior gaúcho. Se o assunto fosse venda de equipamentos, LPs e K-7s - não tinha outra - as novidades sempre pintavam em primeira mão no Bobby. No finalzinho dos anos 80, a loja foi também uma das pioneiras em distribuir por aqui CDs e LDs (um formato anterior ao DVD que acabou não vingando).  O Bobbysom habita um lugar especial na minha memória afetiva: profissionalmente falando foi onde tudo começou. Essa foi minha escola. Entre idas e vindas, fiquei quase cinco anos por lá. Comecei como freelancer aos 18 anos em uma semana de natal, e acabei me tornando gerente de uma das lojas.  Meu chefe direto era o Renato (o famoso Bobby), nome conhecido na cidade que também comandava um estúdio de gravação e uma vídeo locadora.



Olhando para trás, posso concluir que aqueles anos iniciais foram definitivos em minha escolha de trabalhar com música. Depois passei por outras empresas do ramo, mas foi lá no Bobby que o destino ligado ao universo musical foi selado em minha trajetória. Falo de conhecimentos sobre equipamentos e cultura pop em geral, e principalmente de como me tornei um vendedor de discos, e mais: um profissional do ramo. Ouvia muito jazz, blues, orquestras, música nativista, rock and roll, sucessos do momento,  além de ter contato com uma série de clientes que acabaram virando meus amigos. E, sem dúvida, eu devo muito do que sou a colegas de trabalho como Roberto, Otacílio, Edu, Alemão, Marçal, Bira e ao meu primeiro chefe, Renato Rios. Lembro das viagens a São Paulo, quando buscávamos CDs importados e onde também fazíamos contatos com as grandes importadoras de discos. Isso numa época em que comprar pela internet era algo inimaginável. Construímos uma ponte para trazer álbuns gringos sob encomenda que saciou a sede de centenas de pessoas da região. Vendíamos muito! Saí da loja em 1995, quando fui convidado a gerenciar uma outra locadora da cidade. Pouco tempo depois, em 1998, o Bobby fechou às portas. Lembro da estranha sensação que tive na época - de que um pedaço da minha história também estivesse se apagando naquele fatídico dia.



Resgato essa história, porque há algumas semanas descobri que Renato Rios está de volta à ativa. O QG de Renato foi montado no subsolo de sua residência (Rua Cel. Niederauer, 1138) ao lado do Colégio Olavo Bilac. Estive por lá essa semana, e posso dizer que voltei no tempo – mais precisamente até a segunda (e saudosa) metade dos anos 80. LPs, compactos, VHS, LDs, equipamentos de som, vi tudo isso distribuído entre prateleiras, balcões e caixas, com o velho Bobby comandando as operações. Relembrei até coisas aparentemente simples e sem sentido para muitos, como os códigos de barra arcaicos colados aos discos, as etiquetas pretas com números prateados que designavam os valores de tabela e uma série de outras lembranças que só podem ser compartilhadas por quem fez parte daquele inesquecível circo de ilusões.




Voltando um pouco no tempo, é fácil concluir que Renato Rios foi um homem que realizou alguns feitos importantes por aqui. Além da loja de discos que comandou (de 1974 até 1998), como já havia dito, ele também foi proprietário de uma vídeo locadora (a primeira do interior do RS, quando começou locando no formato Betamax), e o homem também capitaneou um estúdio que fez história no estado. Vários festivais nativistas dos anos 80 foram registrados pelo equipamento de gravação do Bobby, seja em estúdio ou ao vivo. Tertúlias, Califórnias, Coxilhas e tantos outros lendários festivais tiveram suas canções capturadas por ele e sua equipe, isso no auge de seus tempos. “Dependendo o mês, eu tinha apenas um fim de semana livre, os outros três ou quatro eu trabalhava gravando artistas do sul ao norte, de leste a oeste do Rio Grande do Sul. E ainda tinha a loja, hehehe”, Renato me disse orgulhoso no último sábado. Entre seus registros célebres, estão a primeira gravação de “O Canto Alegretense” com Bagre Fagundes e Grupo Inhanduy e “Guri”, clássico de João Batista e Júlio Machado que teve magistral interpretação de César Passarinho, com particição de Renato Borghetti na gaita. Em 12 anos de Bobby Estúdio (1981/1993), foram centenas de gravações que se materializaram em LPs e CDs. Entre elas, destaco O Mistério dos Quintais, da dupla Quintal de Clorofila, formada pelos irmãos Dimitri e Nejandre Arbo. Sem falar em outros tantos lançamentos que ganharam distribuição nacional através da RBS Discos e Som Livre. Buscando aprimoramento em seu currículo, vale lembrar de uma passagem de Renato pelos estúdios da Polygram no Rio, quando em pouco mais de uma semana, ele pode acompanhar gravações de artistas como MPB4 e Alcione, e onde aprendeu alguns novos truques que aplicou durante a década de 80, seja gravando, mixando, masterizando ou produzindo canções e álbuns.  



Quem quiser conhecer e absorver um pouco dessa história, a loja do Bobby Digital te ajuda a resgatar uma época que deixou saudades por aqui. Vale a pena visitá-la!
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Comentários

  1. lembrei das mix tapes que eu mandava fazer lá! ia com as listinhas de músicas rabiscadas nos cadernos e deixava no Bobby, pra depois pegar a fita com minhas set lists. Ainda tenho os K7s lá em casa, não tenho mais onde tocá-los, mas não também não tenho coragem de jogar aqueles dois cases de fitas que foram a minha adolescência!

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  2. Tenho orgulho de fazer parte desta história também. aprendi muito sobre Blues com o Grings, saí da Bobby som em 1997, para fazer estágio em Administração de empresas em Porto Alegre e quando voltei em 1999, para visitar a minha família, confesso que fiquei um pouco órfão quanto soube que o Renato Rios havia fechado a última loja da BobbySom. Saudades daquelo tempo... da Galera do Vídeo tembém: Eliane, Júnior, Marçal, Henry, Marcio Grings... Toda a Galera.
    Paulo Bonilla (Ex-funcionário da Booby som e Vídeo)

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