Tempestade


Eis o bando: Donny Heron, Tony Garnier, o Chefe, George Receli, Stu Kimball e Charlie Sexton


Crônica #8 publicada no Diário de Santa Maria 07.09/2012 | N° 3241

Eu sempre tive a sensação de que o impacto de uma obra artística em nossas vidas é algo que nunca pode ser subestimado. Estou sempre em busca de um livro, disco ou filme que possa desacomodar as coisas, afinal, “a ferrugem nunca dorme”. Muitas vezes precisamos sair da zona de conforto. Falo disso por que nessa semana vazou na internet Tempest, o novo álbum de Bob Dylan, que será lançado próximo dia 11.

Comprei o LP pela pré-venda, mas não me contive e escutei as canções que foram disponibilizadas por streaming na internet. Sobre o título, especulou-se que seria uma referência a A Tempestade, última obra de William Shakespeare. Em entrevista à revista Rolling Stone, Dylan refutou a ligação. Agora se prepare, caro leitor: as letras, escritas em parceria com Robert Hunter (advindo do clã do Grateful Dead) estão, sim, shakespearianas e quilométricas. Amor, júbilo, tragédia, traição, vingança e outros temas comuns à humanidade estão lá. O conteúdo intelectual do novo trabalho incomoda, instiga. Nosso herói continua atormentado por seus fantasmas e afiado com a pena na mão.

As primeiras resenhas norte-americanas apontam para a aclamação. Fiquei abalado, apossado, transtornado com aquilo que estou ouvindo exaustivamente nos últimos dias.

Gostaria de saber qual o combustível que mantém um velho artista em ponto de bala, mesmo aos 71 anos. Suas letras são tão boas quanto grande parte daquilo que ele produziu nos anos 1960 e 70. Muitas vezes, tenho a impressão de que certas canções conversam comigo, passam recados, elucidam dúvidas, esclarecem o emaranhado de emoções que tremulam no peito e povoam meus pensamentos. Essas músicas são como faróis que iluminam o mar para naus fustigadas pela tempestade, são como orações que salvaguardam nossos temores.

E em Tempest, esses mesmos temas, em dados momentos, soam como se fossem tocados por uma banda de vaudeville, e não por um grupo de blues/rock. Passeando pelo terreno dos negros norte-americanos do século 20 e pelo country, folk e rock’n’roll, Dylan e seu bando nos levam a lugares onde nunca estivemos, mas onde facilmente poderíamos ir. A música tem esse poder, arte invisível sem bandeiras que une pessoas distintas como um passe de mágica.

No novo álbum, muitas composições poderiam render um bom roteiro de filme. Vou falar apenas de uma, Tin Angel, que nos conta sobre um homem em busca de um amor perdido. O narrador revela uma das mais enigmáticas e trágicas histórias de amor da biografia dylanesca. Desde Isis ele não incursionava por um tema tão brutal: “You died for me / I’ll die for you” (você morre por mim / e eu morro por você). Ela coloca a lâmina no seu coração e parte para a eternidade ao encontro do amante. E ao chegar ao céu, existem tochas brilhantes que iluminam noites e dias. Alguém tem dúvida que Dylan é o Shakespeare da música pop?

Leia a resenha completa de Tempest no link
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