Ela é Linda




Crônica #28 publicada no Diário de Santa Maria 25.01/2013 | N° 3360

Gosto de ouvir vozes femininas no toca-discos lá de casa. Bate uma sensação de conforto. Em muitas noites já tive a companhia de Shelby, Emmylou, Nicolette e outras meninas da música. Algumas vezes, tentei elucidar os mistérios dessa relação platônica com minhas garotas. Sou fissurado em música country. Aí chegamos a Linda Ronstadt, cantora norte-americana que, graças à internet, redescobri nos últimos dias. Vi na íntegra um show que Linda fez na Alemanha, em 1976, logo depois de lançar Hasten Down the Wind, um de seus melhores LPs.



No vídeo, além de uma presença de palco estupenda, Linda mostra uma variação de repertório que pode passear por gêneros diversos. Basta falar de uma canção do set para definir o poder dessa pequena. Ela abre a apresentação com Lose Again, música composta pela cantora/compositora Karla Bonnof, que desde já está no (meu) hall das melhores canções de todos os tempos. O tema começa como um pop romântico, apenas o piano e sua voz que parece desafiar a melodia, ora suave, às vezes acentuando o tom de despedida na letra:


Save me / free me from my heart this time / the train’s gone down the track and I've stayed behind”.


Linda pedindo para ser salva, falando de um trem partindo com seu provável amor que a deixou pra trás. Depois surge violão, baixo e bateria. Então, ela diz que ninguém poderá libertá-la da sensação de estar presa aos grilhões e correntes dessa paixão. E aí, a banda emerge em sua plenitude triste e bonita. O som vira um country maiúsculo, com direito a vocal de apoio, solo de guitarra e todo aquele clima típico de um clássico. Raios! Quem ficou preso fui eu. Faz duas semanas que não consigo parar de ouvir Lose Again. Comprei o álbum original da canção em LP e cá estou eu escrevendo sobre isso. E como ela era bonita em 1976, aos 30 anos. Linda e seus olhos castanhos escuros delineados. Ela e sua blusa branca de babados. Linda e sua calça de tergal azul colada ao corpo. O pulso direito com pulseiras de miçangas e a pele branca realçada por um colar de prata. Duas rosas vermelhas nos cabelos negros, igual uma dançarina de saloon em uma fronteira qualquer com o México imaginário nos filmes de faroeste.





Mais de três décadas depois, a artista permanece como um dos maiores talentos de sua época. Já os tempos de glória fazem parte do passado. A cantora, que nunca se casou, atualmente vive semi-reclusa em sua cidade natal, Tucson, no Arizona. Mas sabe o que é estranho? Pelo menos pra mim, aquele vídeo é o momento definitivo dela. Nunca alguém cantou tanto em apenas uma música. Sob o sal das luzes, poucas vezes uma mulher pareceu tão bonita e verdadeira. Senhorita Ronstadt será perfeita para todo o sempre nessa noite de 16 de novembro de 1976, no Rockpalast, em Offenbach, na Alemanha.

Veja o show completo aqui

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